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Para que o aparato estatal seja compreendido, necessário se faz apresentar o conjunto global de instituições políticas que, dinamicamente, se relacionam à reprodução social do capitalismo.

Alessandra Mara Cornazzani Sales¹

Na sociabilidade capitalista todas essas instituições políticas operam no sentido de bem conduzir a forma política estatal. Essa dinâmica persiste inclusive na divisão geográfica do Estado, em unidades autônomas e federadas, como províncias ou municípios. A tripartição de poderes constituída na contemporaneidade, embora não única, caracteriza uma dessas fragmentações geográficas do Estado.

O que importa destacar é que as instituições políticas podem se apresentar sob a ordem de desdobramentos governamentais ou administrativos. As governamentais, geralmente emanadas diretamente das Constituições, traduzem funções jurídicas de poder, identificando em cada Estado o seu governo. Podem ser o presidente da república, ministros, governadores, prefeitos, legisladores, magistrados. Os administrativos se desdobram como atividades decorrentes do exercício burocrático da administração pública, contemplando órgãos hierarquicamente subordinados aos órgãos de governo.

Por instituições políticas também são considerados os partidos políticos, organizações não governamentais, grupos de pressão, associações, sindicatos, entidades de classe, arcabouços culturais, símbolos, ritos, etc. mesmo que não formalmente estatais sejam, mas guardam simples relação íntima com a vida política. “In verbis”: “O fenômeno político, no capitalismo, não se limita ao Estado, mas nele se condensa. O Estado é o núcleo material da forma política capitalista. O governo é o núcleo poderoso e dirigente do Estado e a administração pública é seu corpo burocrático. Governo e administração são os organismos da política estatal (p.38).”

As instituições sociais, por sua vez, são materializadas no seio das próprias relações sociais, quando concretamente apreendidas e podem ser originadas de determinação jurídica estatal.

No aparato do Estado, de suas instituições políticas e sociais é que o núcleo da política se consolida. Como enfatizado pelo autor, “as instituições políticas, no capitalismo, operam sua dinâmica sob a coerção da forma política e das formas sociais do capital” (idem).

A burocracia, dentro desse contexto, apresenta-se como fenômeno inevitável. Isso porque deriva a burocratização do Estado nos aparelhos que o materializa e que são as instituições políticas, que o integram, e sociais, que o interagem.

Trata-se de sistema regido por normas jurídicas e competências firmadas pelo direito, com parâmetros imediatos provindos da força técnica ou econômica interna e regulação jurídica.

Contudo, também se reveste de origem prescrita na forma social e, portanto, de raiz estrutural e materialização exprimidas como se organismo vivo, ágil e contraditório fosse.

Assim, a burocracia encontra raízes não apenas nas práticas materiais concretas, como nas próprias relações sociais gerais.

Do mesmo modo como ao Estado, a burocracia também é constituída de corpo estrutural e autônomo apartado das classes, indivíduos e grupos, com materialização de poder e de funcionalidade próprias, o que as torna, por vezes, não tão complacentes às influências e capturas da sociedade, logo, parciais às demandas sociais. Essa parcialidade é variável, conforme circunstâncias sociais, econômicas e de lutas de classes. No plano estrutural, as lutas de classes acabam por constituir o fator primordial de reelaboração da burocracia.

Para manutenção dos aparelhos estatais, a burocracia empreende ações tendentes à eficácia da continuidade da valorização do valor, da reprodução capitalista.

Apresenta reação aos interesses imediatos de classes, indivíduos e grupos, enquanto são atravessadas estrutural e funcionalmente pelas sociedades capitalistas. De modo que eventual período de lucidez da burocracia não remete ao papel de salvação ou manutenção das condições ditas ideais ao capitalismo; ela responde apenas por um encadeamento vital de relações que sustentam o capitalismo, figurando-se como sujeito delas dependente.

Assim, é por isso que o Estado não é o garantidor funcional do equilíbrio capitalista ideal; atravessado pela estrutura capitalista também o é. Age por ações múltiplas, sem necessariamente ascender posição de domínio sobre a sociedade. Imaginando-se ter um capital ameaçado por ato dos legisladores, seu núcleo será certamente resguardado por ação dos poderes judiciários, de defesa da propriedade privada. “As eleições, de modo geral, por exemplo, podem até dar diretrizes imediatas ao governo, mas não alteram as amarras jurídicas gerais do Estado” (p.83).

Nem por isso é absolutamente neutro às lutas externas a si o Estado, pelas instituições políticas e burocráticas que o integram.

O Estado é corresponsável às lutas de classes no capitalismo, justamente porque além de econômico o conflito entre capital e trabalho, político também o é. “A burocracia age sendo disputada – de modo múltiplo e variável – pela luta de classes, e, de acordo com sua relativa autonomia, reconstituindo-a” (p. 84).

Eis aqui as reflexões de estudo extraídas da doutrina do Professor Doutor Alysson Leandro Barbate Mascaro. (in Estado e Forma Política. São Paulo: Boitempo, 2013).


 

¹Advogada. Pregoeira. Especialista em Negócios Governamentais pela FEA/USP. Membro da Comissão de Propostas de Parcerias e Convênios Públicos da OAB/SP. Mestranda em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Assessora e Professora da Escola Superior de Contas e Gestão Pública Conselheiro Eurípedes Sales, do Tribunal de Contas do Município de São Paulo.