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*Valmir Leôncio da Silva

Hoje nosso país vive um momento delicado, devido a vários fatores ocorridos recentemente e que envolvem questões ligadas ao planejamento, equilíbrio das contas públicas, transparência e fiscalização, são exemplo disso:

- Criação de novos municípios.
- Estados deficitários
- Déficit na previdência Social
- etc...etc...etc...

E a cada dia, novos problemas aparecem, não porque, simplesmente surgem, mas sim por que estavam escondidos e não ainda não haviam “emergido”.

Só para se ter uma ideia dos 26 Estados existentes, ao menos 06 são deficitários, Estados como Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Roraima, Rio Grande do Norte e Mato Grosso declararam oficialmente que não terão condições de cumprirem seus compromissos nesse ano.

Para assustar um pouco mais podemos citar, também, que as contas do setor público, que consolidado, registraram um déficit primário de R$ 108,258 bilhões, ou 1,57% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2018, conforme informa o Banco Central (BC).

Por fim é interessante citar que o jornal o estado de São Paulo publicou noticia que os Tribunais de Contas negociam o fim da “maquiagem” nos dados dos Estados. Segundo a reportagem após serem avaliadas as contas de Estados que agora decretam calamidade financeira, os tribunais iniciaram uma negociação para tentar desfazer as maquiagens (g.n), que retardam o real diagnóstico da situação fiscal dos governos regionais. A ideia seria unificar os entendimentos sobre a LRF, já que alguns estados flexibilizaram esses limites e assim permitiram a contratação de empresas e aumentos salariais que colocaram as contas destes Estados à beira de um colapso.

Vamos parar por aqui e tentar responder a pergunta título desse artigo: Esse país tem solução?

Infelizmente, nosso poder não nos permite fazer milagres e temos que contar com o “material” que temos e que não são poucos, mas infelizmente não são bem utilizados. Temos uma série de legislações, mas muitas delas, principalmente, as que dizem respeito ao controle das contas públicas, infelizmente, desatualizadas.

Neste artigo cito apenas um exemplo, a Convergência das Normas de Contabilidade do Setor Público, que se virassem lei poderiam ajudar e muito no controle do déficit da administração pública, ou seja, poderiam ajudar os Estados a saírem do “vermelho” e ajudariam a evitar que outros entrassem.

Tudo começou no ano de 2008, pois, devido a acordos internacionais, o Brasil iniciou o processo de convergência as Normas Internacionais de contabilidade aplicada ao setor público, chamada de IPSAs. Na esteira de grandes nações.

Um estudo da Ernst & Young com 19 jurisdições mostra que as IPSAs  são usadas atualmente pelos governos centrais do Reino Unido, da França, da Suécia, da Suíça e da Lituânia, enquanto Holanda e Noruega estão em processo de convergência.

A princípio foram editadas 10 normas, que tinham o intuito de “fazer de verdade” a contabilidade nacional, oferecendo assim um controle dos gastos públicos para o administrador público, entenda-se o prefeito, governador e presidente e consequentemente trazer uma maior transparência das contas públicas. Mas, o que aconteceu foi que essas normas, não vieram em forma de lei e sim resoluções do CFC, Conselho Federal de Contabilidade, órgão que fiscaliza e norteia as atividades dos profissionais de contabilidade e não as atividades da administração pública. Não podendo assim obrigar o administrador a utilizar tais regras, uma vez que elas não são leis.

Em minhas aulas na pós-graduação desta Escola de Contas, tenho pedido aos alunos que pesquisem a aderência das normas pelos Estados e o que vemos é que muitos Estados são incipientes, ou seja estão em um estágio inicial de implantação.

Independente disso a partir de janeiro de 2.017 passou a vigorar um novo conjunto de normas internacionais voltadas ao setor público, além de uma especifica que dispõe a respeito da Estrutura Conceitual (NBC TSP), publicada em outubro de 2016. Ao todo, são 32 normas, que devem ser convergidas a partir da liberação de módulos até 2021. Nesses anos tivemos a revogação de várias normas e a edição de outras tantas, sendo que tanto hoje temos 24 normas em vigor.

A legislação que regulamenta a contabilidade pública brasileira data de 1964 e não reflete os avanços pelos quais passou a contabilidade e a sociedade no período. Dessa forma o CFC e o Tesouro Nacional que estão à frente da implantação das 24 normas, têm sofrido muito, pois uma vez que elas não são leis, fica difícil a implementação por partes dos administradores públicos, pois não existe a obrigatoriedade legal.

Para acertar essa situação está em tramitação no Congresso Nacional o PLP 295/16, que trata da LQF - Lei de qualidade Fiscal.

Esse projeto tem como ponto fundamental organizar os processos e procedimentos do ciclo de gestão das finanças públicas, sem alterar drasticamente as regras da Lei de Responsabilidade Fiscal e da Transparência Pública. Irá tratar de regras gerais de finanças públicas. Tais como: instituir ou aprimorar anexos e relatórios para acompanhar a sustentabilidade fiscal dos entes públicos; propor um orçamento mais realista , ou seja, irá desestimular a superestimação de receitas; trará uma visão sistêmica para projetos: investimentos, contabilidade, controle de custos e avaliação do patrimônio público e por fim, não menos importante autoriza a convergência as normas Internacionais de Contabilidade pública.

Mas, infelizmente, o que vimos até agora é que não existe interesse dos senhores deputados em aprovarem tal projeto, tanto que ele está parado desde junho de 2016 na Câmara dos Deputados. Espero que esse novo governo tenha a coragem de enfrentar mais esse desafio e incentivar nossos “eleitos” a aprovarem essa lei, que com com certeza será um grande marco para a Administração Pública.

A verdadeira contabilidade preza a continuidade da administração. O regime de competência para receitas e despesas e o controle patrimonial fornece à administração pública instrumentos de gestão vitais. Um dos “relatórios” requeridos pela lei é a elaboração de demonstrações dos fluxos de caixa, que permitirá que os governos avaliem as ações no longo prazo, projetando se terão condições financeiras de manter ou ampliar seus serviços. Trata-se de uma ferramenta de planejamento estratégico.

O desafio é enorme. Mas, ao final, terá valido a pena e os novos controles serão instrumentos valiosos para o trabalho de fiscalização dos tribunais de contas e da sociedade. A uniformização da contabilidade e a adoção das boas práticas governamentais vão ajudar a eliminar o maior aliado da ineficiência e da corrupção, que é a falta de procedimentos e de transparência.

Se quiser conhecer o projeto basta visitar o site:

https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=3931973&ts=1548957745359&disposition=inline


* Auditor do TCMSP – Tribunal de Contas do Município de São Paulo, Conselheiro do CRCSP e Membro da Academia Paulista de Contabilidade. E autor do livro A Nova Contabilidade Aplicada ao Setor Público. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2014 e coator do Livro Lei de Responsabilidade Fiscal para os municípios – uma abordagem prática. 2ª Ed. São Paulo: Atlas, 2007.