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Quando o Natal é triste...

Marisa Moura Verdade

Dezembro chegou com suas festas natalinas. Para alguns, o Natal é um feriado religioso e tudo mais é acessório. Importante é comemorar o nascimento do Menino Jesus e a chegada da salvação.

Esse vínculo religioso gera um tempo simbolicamente forte: a criança divina é a luz na escuridão da noite, é a paz e o sol da reconciliação. A devoção glorifica essa noite feliz, apesar do estresse das compras e dos preparativos das ceias. Outros consideram que o Natal perdeu o significado religioso ao ser moldado por valores da sociedade de consumo, mas permaneceu inspirador. Nas semanas que antecedem o feriado muita gente começa a sintonizar o “espírito natalino”, uma série de emoções e sentimentos que envolvem felicidade, generosidade, boa vontade, reconciliação e harmonia. Como festividade desligada da esfera religiosa, o Natal foi transformado num tempo para ficar junto dos outros. Neste contexto, a festa é dedicada ao amor humano – que une as pessoas e cuida da vida comunitária. Talvez, por isso, os festejos natalinos seguem encantando muita gente.

Apesar das bênçãos do Menino Jesus e da nobreza do espírito natalino, todo mundo conhece alguém que detesta essa época do ano. Quem reclama descreve uma fase de profunda tristeza, dominada por sentimentos de vazio e solidão. Tal estado emocional recebe várias denominações, as mais conhecidas são: Natal Triste, Natal Depressivo e Natal Infeliz (Christmas blues). Trata-se de um sofrimento sazonal, típico do período natalício. Os dados sobre esse quadro depressivo são vagos e não configuram uma patologia mental. No entanto, as queixas são frequentes na clínica psicológica. As causas desse humor depressivo não são associadas ao consumismo ou à troca de presentes, tampouco aos sentimentos de injustiça diante dos mais pobres. Na maioria das vezes, a infelicidade natalina tem relação com carências da própria infância e conflitos psicológicos atuais, provocados por “cobranças” internas e externas para participar da animação coletiva.

É difícil assumir como infelicidade uma festa que a maioria recebe com satisfação e entusiasmo. Contudo, é evidente que as condições do mundo contemporâneo causam perdas significativas na esfera do contato humano. A expansão da comunicação via celular, e-mails, redes sociais e afins não substitui o olhar carinhoso, o abraço do coração, o “conta comigo” no aperto de mão. O desencanto natalino diz respeito a dificuldades inerentes ao encontro humano e à renovação da vida. É provável que a ênfase natalina no “estar juntos” funcione como lembrete doloroso do que está faltando na própria vida.

Dezembro é um mês particularmente difícil para quem lida com conflitos familiares, perdas, rompimento, divórcio ou solidão. Dentre todos, a solidão é o grande problema nos feriados do final do ano. A questão não é propriamente o sentimento de solidão, o que dói é não sentir conexão com o outro. A pessoa sente-se perdida, mesmo cercada do carinho dos mais próximos. Às vezes, o sofrimento está na falta de vontade para ficar junto. Outras vezes, a tristeza implica a impossibilidade de estar próximo e festejar com os mais queridos. Então, o que fazer quando o Natal Infeliz se instala na alma e a angústia substitui o clima de alegria que o período exige?

Depressão natalina é um transtorno afetivo sazonal (SAD) que pode ser tratado e gerenciado com autocuidado. Algumas práticas ajudam a atravessar essa fase difícil. O primeiro passo é recuperar o bem-estar psicológico. Ter um tempo para si mesmo é essencial, ainda que seja necessário dizer não para os outros. Ansiedade excessiva indica necessidade de arejar a mente com exercícios físicos leves. Se o mau humor e a depressão continuam depois das festividades natalinas, é hora de procurar ajuda médica e avaliação psicológica. Autoconhecimento é o caminho para compreender mudanças emocionais e descobrir modos de solucionar conflitos.


*Psicóloga, Mestre em Educação Ambiental, Doutora em Psicologia do Desenvolvimento Humano, especializada em Psico-Oncologia, pesquisadora do Laboratório de Psicologia Social da Religião do IP-USP. Autora do livro Ecologia Mental da Morte. A troca simbólica da alma com a morte. (Editora Casa do Psicólogo & FAPESP). E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.