Estrela inativaEstrela inativaEstrela inativaEstrela inativaEstrela inativa
 

Assessoria de Imprensa, 27/08/2019

Em sua exposição neste primeiro dia do X Educontas, encontro realizado no Plenário do Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCMSP) com a intenção de compartilhar as experiências das Escolas de Gestão e Contas (EGC) dos Tribunais de Contas do Brasil, o economista e professor Amir Khair tratou do tema “Crise fiscal e os impactos nas contas públicas”.

Ao apresentar o expositor, o conselheiro dirigente da EGC do TCMSP, Maurício Faria, exaltou a respeitabilidade do palestrante e traçou um quadro da delicada situação fiscal pela qual passam diversos estados e municípios da Federação. Um quadro desafiador na medida em que, como lembrou o conselheiro do TCMSP, muitos se questionam sobre a responsabilidade dos Tribunais de Contas diante dessa realidade fiscal tão aguda, que está inserida numa conjuntura econômica e política nacional e internacional de grandes incertezas, que impacta diretamente nas possibilidades de reversão dessa crise.

Ao iniciar sua exposição, Amir Khair ressaltou que quem depende do Estado tem interesse direto em que esse Estado seja eficiente, que saiba usar os recursos que vêm em sua maioria da classe média e da população de menor renda em prol da população mais vulnerável da sociedade. “Infelizmente muito disso não está acontecendo porque hoje a discussão fiscal encontra-se muito travada no Brasil”, observou o economista, dando como exemplo a discussão sobre o déficit fiscal, que sempre foi tratado simplesmente como déficit primário, ou seja, a diferença entre receitas e despesas, eliminando-se os juros. “Com isso o déficit chegaria a 100 bilhões de reais, só que, na verdade, ele se aproxima de 500 bilhões, pois são 100 bilhões de déficit primário e outros 400 bilhões de juros”, calculou. Amir alertou que, ao ignorar nessa conta o peso dos juros, que representam 80% do déficit, só se combateria a crise fiscal criando e aumentando impostos ou cortando despesas, o que traria impactos sociais expressivos, ainda mais quando se tem uma crise nos últimos cinco anos que aumentou a demanda por serviços públicos em função dos altos índices de desemprego e desocupação e pela precarização do mercado de trabalho.

Ao dividir sua apresentação em cinco partes, Amir Khair abordou a evolução das principais variáveis macroeconômicas (Produto Interno Bruto, a evolução do câmbio, a evolução da Selic, os juros ao tomador e a carga tributária); a evolução dos déficits fiscais e das dívidas públicas, que são os termômetros da questão fiscal; a queda do resultado primário do governo central; e a crise e seu impacto na Previdência Social; finalizando com algumas propostas a serem debatidas na sociedade.

Na questão das variáveis macroeconômicas, o expositor mostrou a evolução do PIB brasileiro do início do século 20 aos dias de hoje, dividindo esse painel em três momentos. No primeiro, que vai de 1901 a 1980, houve um crescimento médio do PIB nacional de 5,7% ao ano, enquanto o crescimento médio populacional chegou a 2,4% ao ano, representando um crescimento per capita de 3,2%. Esses números sofreram uma queda no período 1981 a 2003, quando o crescimento econômico médio ficou em 2 % ao ano, a população cresceu 1,7%, sendo o crescimento per capita, portanto, de apenas 0,3%. A evolução voltou a ficar favorável entre 2004 e 2010, com crescimento médio econômico anual de 4,4% e crescimento populacional de 1,1%, perfazendo um crescimento econômico per capita de 3,3%. Os índices, porém, despencaram entre 2011 e 2018, período em que o crescimento econômico ficou em 0,2%, contra um aumento populacional de 0,9%. Como resultado, registrou-se um recuo de 0,7% no crescimento per capita médio dos brasileiros.

Ao relacionar esses números com os déficits fiscais registrados ao longo do tempo, o economista mostrou que em períodos nos quais se tem estagnação econômica ou recessão o impacto fiscal é perda de arrecadação, e quando isso ocorre você aumenta a demanda social sobre o Estado. “Nessa situação, se não se der atenção ao crescimento econômico e à questão dos juros você não tem saída para combater o déficit fiscal”, alertou Amir Khair, lembrando que o câmbio também tem efeito direto sobre a dívida pública até por afetar a competitividade dos produtos nacionais no mercado internacional e limitar a obtenção de divisas. No caso da Selic (taxa básica de juros), o economista alertou para a perigosa máxima assentada na sociedade brasileira de que se deve aumentar a taxa Selic para combater a inflação. “Só agora isso está sendo contestado, até porque a taxa Selic passa ao largo de 80% dos preços de produtos e serviços oferecidos no mercado”, afirmou, atentando que a taxa básica de juros em muitos países hoje se encontra em índices semelhantes aos da inflação ou até abaixo destes.

Os juros ao tomador é outro motivo de entrave, na medida em que o crescimento econômico, um dos pontos de combate ao déficit fiscal, depende do consumo das famílias, e este é limitado pelas altíssimas taxas de juros, além da má distribuição de renda e da alta concentração tributária sobre o consumo. O mesmo problema afeta o empreendimento das pequenas e médias empresas, historicamente as maiores geradoras de empregos no país. Em relação à carga tributária, Amir lembrou que ela sofreu uma sensível elevação em 1999, quando o Brasil foi obrigado a recorrer ao Fundo Monetário Internacional, alcançando hoje o índice, ainda não oficial, é de 33,6% do PIB. “É uma carga alta, mas ninguém está pensando em reduzi-la nesta reforma, pois os compromissos nossos são muito pesados”, frisou.

Um dos gráficos apresentados na exposição para o qual o economista pediu a máxima atenção foi o que mostrava a evolução da receita e da despesa das contas públicas. Para ele, ao tratar a crise fiscal aborda-se sempre o lado do crescimento da despesa, e raramente olha-se para a receita. Numa perspectiva histórica, a receita sempre esteve acima da despesa, mantendo uma relação de paralelismo estável, o que mudou a partir de 2015, quando a despesa se manteve constante, mas a receita passou a cair consideravelmente. “De tal modo que é três vezes mais forte a perda de arrecadação em relação à despesa. Isso mostra claramente o impacto da crise econômica na questão fiscal”, afirmou.

Finalizando sua explanação, Amir Khair destacou algumas propostas para enfrentar a crise fiscal, enfatizando a necessidade de atacar as questões das despesas, das receitas e dos juros. “Não há nada mais eficiente para melhorar as receitas do que o crescimento econômico. Quando se tem crescimento econômico da ordem de 3%, 4% ou 5% ao ano, você cresce a arrecadação de tributos ao menos 3% acima disso, pois você aumenta o consumo e diminui a inadimplência das pessoas físicas e jurídicas”, afirmou. Outro ponto seria reduzir a carga tributária sobre o consumo. “Quanto à despesa, essa redução precisa ser qualificada. É preciso saber quais despesas devem ser cortadas e quais devem crescer”, ponderou, concluindo com a necessidade de se diminuir as taxas de juros, inclusive utilizando as reservas que o país possui.

No papel de comentador, o jornalista João Villaverde preferiu centrar suas observações numa análise das fases pelas quais os Tribunais de Contas passaram ao longo de sua história. Dividindo essa trajetória em ondas, ele pontuou que a primeira onda iniciou-se com a promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que deu aos Tribunais de Contas instrumentos e metas para pautarem sua atuação. “Apesar de sua competência ter sido estabelecida pela Constituição de 1988”, observou o jornalista. A essa fase, surge uma segunda onda, a partir do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, na qual o Tribunal de Contas da União (TCU) teve papel preponderante ao apontar as chamadas “pedaladas fiscais” como crime de responsabilidade fiscal, lançando sobre si a suspeita levantada por alguns setores da sociedade de que o mesmo critério não havia sido utilizado para práticas semelhantes cometidas por outros governantes. “Mesmo que o TCU não tenha extrapolado de suas competências no processo que resultou no impeachment da ex-presidente”, observou.

Outro ponto que, segundo Villaverde, vem chamando a atenção da opinião pública para os Tribunais de Contas é a inadimplência de muitos estados e municípios brasileiros, o que lança suspeita de que os órgãos não desempenharam corretamente seu único papel que seria o de fiscalizar e controlar o uso correto dos recursos públicos. “Há uma inquietação por parte da sociedade de se questionar para que servem os Tribunais de Contas, se eles não viram as contas públicas piorarem”, frisou, lembrando ainda que a opinião pública passou a querer saber: o que fazem esses órgãos e quem os controla?

Para Villaverde, essa onda está se esgotando e uma terceira onda se avizinha. Nessa nova fase, ele arrisca prever que talvez a sociedade exija um redesenho do papel dos Tribunais de Contas, da mesma forma que outros temas estão passando por esse processo de transformação, como a Previdência Social e a Reforma Trabalhista. “Estamos vivendo tempos excepcionais, e isso pode levar a transformações radicais”, acredita. O que reforça essa visão, segundo o jornalista, é que o Brasil encontra-se hoje politicamente rachado e radicalizado, o que, ao lado da crise econômica atual, dificulta a busca de soluções para o país.

Em sua intervenção, o conselheiro Maurício Faria afirmou que as exposições haviam colocado em pauta questões muito instigantes, mas que procuraria tomar como referência a exposição do economista Amir Khair, sem deixar de relacioná-la aos pontos trazidos ao debate pelo jornalista João Villaverde. Essa interlocução foi feita tomando como referência o parecer prévio das contas do prefeito de São Paulo recentemente apreciadas pelo colegiado do TCMSP. “Isso enseja muitos questionamentos em relação ao porquê de não terem sido emitidos pareceres prévios pela rejeição das contas de governantes de estados que apresentavam uma situação fiscal crítica. Porque muitos levaram em conta o histórico das contas públicas e não apenas a condição das contas no momento da execução orçamentária que estava em julgamento, considerando inclusive esforços eventuais no sentido de melhorar as condições fiscais daquele quadro adverso herdado por muitos governadores, mesmo que não tenham alcançado o equilíbrio fiscal”, ponderou o conselheiro do TCMSP, lembrando que isso hoje está sob discussão até porque não há na legislação nenhuma definição precisa de qual o critério para os Tribunais de Contas definirem o parecer prévio.

No caso da Capital Paulista, o conselheiro Maurício Faria sublinhou que há algumas condições diferenciadas. Um deles é o tecido econômico pujante da cidade que fez com que as receitas do município tivessem um crescimento sistemático acima da inflação – salvo no recente período de crise –, o que deu uma condição fiscal mais favorável. “Mesmo em 2018, no parecer prévio das contas, tivemos uma situação de equilíbrio fiscal básico”, afirmou o conselheiro do TCMSP, lembrando que, por diversas condições institucionais históricas, prevaleceu uma cultura de cuidado fiscal esteve presente, atravessando diversas gestões, com iniciativas de buscar alternativas para melhorar as receitas, como operações urbanas, entre outras formas de receitas extraorçamentárias.

No entanto, mesmo diante desse quadro de razoável equilíbrio, o conselheiro Maurício Faria ressaltou que no próprio parecer prévio das contas de 2018, recomendando a aprovação sem ressalvas, foram apontados alguns fatores de risco que podem levar a uma deterioração desse quadro fiscal. Dentre eles merecem destaque o aumento expressivo de despesas de pessoal embutidas nas parcerias públicos privadas, como na Saúde, Assistência Social e Educação; o alto patamar da renúncia de receitas, sem explicitação pública dessa questão fiscal; e depósitos judiciais, cujo resultado tem grande dose de incerteza; além das despesas previdenciárias dos servidores municipais e os subsídios aos transportes por ônibus na cidade de São Paulo. “É um quadro muito complexo o do município, em razão inclusive da precarização das condições da população que vivemos hoje”, finalizou o conselheiro do TCMSP.

Antes do encerramento do encontro, o presidente da Atricon (Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil), Fábio Nogueira, pediu a palavra para fazer alguns contrapontos às colocações do jornalista João Villaverde sobre a atuação dos Tribunais de Contas. Dentre os pontos levantados, ele ressaltou as posições contraditórias que muitos setores manifestam em relação ao papel das Cortes de Contas, ora criticando seu papel mais ativo, que invadiria a discricionariedade da gestão pública, ora reclamando de leniência em relação à situação fiscal das Administrações Municipais e Estaduais. “Isso ocorre muitas vezes porque a opinião pública desconhece o papel e as competências dos Tribunais de Contas. É preciso ver também como têm atuado outras instituições, como as que compõem o Poder Judiciário e o Ministério Público”, ponderou o presidente da Atricon, considerando muitas vezes injustas algumas críticas voltadas aos Tribunais de Contas. “Apenas em 2018, Tribunais de Contas do Brasil julgaram 350 mil processos, que resultaram na aplicação de 16 bilhões de reais em multas”, exemplificou Fábio Nogueira, questionando, porém, se seria exercer esse papel punitivo o real objetivo das Cortes de Contas.

Para assistir às explanações na íntegra, clique aqui

O professor Amir Khair tratou do tema “Crise fiscal e os impactos nas contas públicas”.Economista e professor Amir Khair 


Conselheiro Mauricio Faria exaltou a respeitabilidade do palestrante Conselheiro Maurício Faria

 

O jornalista João Villaverde participou como comentaristaJornalista João Villaverde 

 

Encontro visa compartilhar as experiências das Escolas de Gestão dos Tribunais de Contas do Brasil(Da esquerda para direita) Amir Khair, conselheiro Mauricio Faria e o jornalista João Villaverde

 

Presidente da Atricon Fábio Nogueira ressaltou posições contraditórias que muitos setores manifestam em relação ao papel das Cortes de ContasPresidente da Atricon Fábio Nogueira ressaltou posições contraditórias que muitos setores manifestam em relação ao papel das Cortes de Contas

Presidente do TCMSP, João Antonio, também participou do debate

Presidente do TCMSP, João Antonio, também participou do debate

 


Adicionar comentário

Código de segurança

Atualizar

 
 
 
 
 
 

 

Assine a nossa newsletter para receber dicas de eventos, cursos e notícias da Escola de Gestão e Contas.

 

INSCREVA-SE!