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Assessoria de Imprensa, 29/09/2020

Foi sancionado pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, no dia 15 de julho de 2020, o novo Marco Legal do Saneamento Básico. Segundo o governo, o principal objetivo da legislação é universalizar e qualificar a prestação dos serviços no setor e alcançar a universalização até 2033, garantindo que 99% da população brasileira tenha acesso à água potável e 90% ao tratamento e a coleta de esgoto 

O novo Marco Legal traz algumas novidades para a Lei de Saneamento, uma discussão muito interesse tanto para o Brasil, quanto para o estado e município de São Paulo. Por isso, a Escola de Gestão e Contas do Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCMSP) organizou, na sexta-feira (25/09), um webinar sobre o assunto com palestras do ex-diretor-presidente da Agência Nacional de Águas (ANA), Vicente Andreu Guillo, do presidente em exercício do Comitê da Bacia Hidrográfica do Alto do Tietê, Amauri Pollachi, e do coordenador das atividades do município de São Paulo no programa "Mananciais" e responsável técnico pela execução de obras e projetos, Ricardo Corrêa Sampaio.

O novo Marco Legal é uma legislação que altera um conjunto de legislações, inclusive a legislação de saneamento. "Altera a Lei de Consórcios, a Lei de Águas e cria um referencial novo, mas ele não é exatamente um marco específico, um novo marco do setor de saneamento", iniciou Andreu. "De uma maneira geral, essa Lei (14.026) é profundamente negativa, todas as suas orientações são no sentido de esquartejar as empresas estaduais e criar um mercado no sistema de saneamento para a entrada do capital privado, mas no que tange à regulação, o que fomos identificando ao longo do tempo é que o setor de saneamento sempre foi um setor autorregulado, o que significa que o próprio sistema definia as condições do seu planejamento, expansão, quem atende e, principalmente, as tarifas. Com o advento da Lei 11.445 de 2007, a legislação previu a constituição de agência reguladoras e aí começa um processo de criação de agências reguladoras no Brasil. Essas agências reguladoras não têm um perfil totalmente definido, ou seja, podem ser criadas no âmbito municipal pela própria empresa ou podem ser criadas de uma maneira regional. [...] Elas acabaram capturadas pelos interesses das empresas de saneamento, principalmente porque são as próprias empresas de saneamento que pagam o funcionamento das agências. E mais: a legislação anterior permitia que, se desejasse, uma empresa de saneamento poderia se associar a qualquer agência reguladora do estado", completou o ex-diretor-presidente da ANA.

Segundo Vicente Andreu, a supervisão regulatória cria uma uniformidade no território nacional sobre como tratar a parte de contabilidade, como tratar as questões das ligações também. "Praticamente tudo passa a ser melhor organizado nacionalmente", disse. Já sobre a Lei 14.026, ele opina: "Aquilo que poderia ser um avanço do saneamento no Brasil, que é o aprimoramento da regulação, acabou ficando totalmente contaminado por essa visão extremamente privatista da Lei 14.026. [...] A Lei, inclusive, criou uma situação entre agência reguladora e o órgão prestador. A empresa pode escolher qualquer órgão regulador do Brasil. Então, criou uma situação extremamente frágil, na minha opinião, confusa, e deve produzir mais prejuízos do que avanços dentro de uma questão que poderia ser positiva".

"Essa Lei é inconstitucional. Por que ele não permite mais que você transfira diretamente para a empresa estadual? Porque ele pretende que qualquer concessão de saneamento seja submetida obrigatoriamente à licitação. Na licitação as empesas públicas podem concorrer, mas você já não tem mais essa relação de poder público com o poder público. [...] Além disso, ele ainda esfacela as empresas estaduais, criando as chamadas unidades regionais de saneamento. [...] O que vai acontecer? Aquilo que poderia ser um planejamento muito mais integrado, que é o que está sendo feito, inclusive tarifário, nem sempre é assim tão simples, mas, na verdade, você tem algumas empresas onde o município mais rico subsidia os municípios mais pobres, e isso acabou", explicitou Andreu. "Tudo isso tem como finalidade na Lei de Saneamento não a melhoria dos serviços, não a melhoria da regulação, mas sim um processo violento de fragmentação daquilo que o setor de saneamento no Brasil, o setor público, foi avançando a duras penas, e abrir um mercado para a participação do capital privado no setor de saneamento", acrescentou.

Com foco na regulação e os efeitos no estado de São Paulo, Amauri Pollachi abordou a questão da água e do esgotamento sanitário com um viés de direitos humanos. "É um direito humano fundamental o acesso à água limpa e segura e ao saneamento. E, nesse sentido, significa que ela deve estar disponível, acessível, segura, aceitável e acessível economicamente", expôs Pollachi com base na Resolução 64/292 da Assembleia Geral das Nações Unidas, salientando ainda que o preço dos serviços de saneamento não pode impedir que outros direitos humanos, como moradia e alimentação, sejam atendidos.

Pollachi também traçou um breve histórico do saneamento básico no país e apresentou os níveis de atendimento de água e esgotos segundo macrorregião geográfica e no Brasil todo. "O déficit de serviço de saneamento, hoje, está em áreas que não são atrativas para a promoção de investimentos de extensão de redes de abastecimento de água, redes de coleta de esgotamento sanitário, de tratamento. Há uma disfunção nesse sentido: onde mais precisamos é onde hoje, por exemplo, companhias estaduais que já atenderam grande parte da área das cidades onde operam as áreas formais das cidades, agora investem, fundamentalmente, nas áreas onde predominam os assentamentos precários, a chamada cidade informal", ressaltou.

O presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Alto do Tietê comentou um organograma sobre funções de gestão dos serviços públicos aplicado ao saneamento básico e destacou que "na cidade de São Paulo não existe controle social da prestação de serviço de saneamento". Falou sobre o contrato com a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) e do Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB), "que deve abranger os quatro componentes do saneamento básico e orientar os investimentos em saneamento, sendo um veículo para a sociedade conhecer e entender o saneamento".

"Queria destacar que esse novo Marco Legal se propõe essencialmente a fazer três mudanças: concentrar atribuições e poder regulatório na Agência Nacional de Águas por meio de normas de referência; oferecer maior segurança jurídica para o setor retirando obstáculos para atrair investimentos privados e viabilizar a universalização, abrindo o mercado para a iniciativa privada, eliminando os contratos de programa por concorrências para concessões ou transformando esses contratos de programa em contratos de concessão", pontuou.

De acordo com Pollachi, com a Lei 14.026 não é permitida a gestão associada, não sendo mais tolerada a permissão e tampouco a autogestão como forma de prestação de serviços públicos para saneamento. E apontou as seguintes consequências para a população:

Em caso de privatização da empresa pública de economia mista prestadora de serviços públicos de saneamento básico, os contratos em execução poderão ser substituídos por novos contratos de concessão, sem anuência prévia da alienação pelo Município e seus habitantes;
A obrigação de instituição de blocos ou unidades regionais de municípios para a prestação de serviços públicos de saneamento básico em determinada região cujo território abranja mais de um Município;
O fim do subsídio cruzado que possibilitou investimentos de saneamento em cidades pequenas e áreas de baixa renda;
A obrigação do Município instituir taxas para os serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos para cobrir todos os seus custos no prazo de um ano;
Ele lembrou, por fim, que a reestatização de serviços de saneamento em centenas de cidades no mundo foi motivada por: (I) aumento de tarifas; (II) má qualidade na prestação dos serviços; (III) precarização das infraestruturas e do trabalho; (IV) descumprimento de metas contratuais.

Ricardo Corrêa Sampaio foi o último palestrante do evento e contou sobre sua experiência na prefeitura de São Paulo dentro da questão do saneamento básico nas regiões das bacias de contribuições Billings e Guarapiranga. "São duas regiões que chegaram a um grau de degradação ambiental enorme, fruto de ocupações desordenadas e completamente sem controle", alertou. "Quanto mais poluído, mais degradado esse meio ambiente, mais caro o tratamento. Quanto mais caro, mais proibitivo é o acesso à população de mais baixa renda a esse direito de acesso à água, que é fundamental para a existência humana. Então, esse serviço de fornecimento de água potável, quanto mais barato, menor o custo, menor a taxa e mais acessível a toda a população", evidenciou.

O Programa Mananciais teve sua primeira fase em 1995 e "tem por objetivo fundamental a conservação e o saneamento ambiental das represas Guarapiranga e Billings que são responsáveis pelo abastecimento de 4,7 milhões de habitantes do Município e Região Metropolitana de São Paulo. Para isso, busca controlar a ocupação desordenada nas áreas de mananciais e desenvolver ações de recuperação social e ambiental nos bairros existentes.[...] No Programa foi muito importante a integração intergovernamental, tanto com os governos federal, estadual e municipal, mais as empresas estatais, a Sabesp no governo de São Paulo, CDHU [Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano], contando ainda com a participação do Ministério Público, onde conseguíamos acordos e uma atuação conjunta para ter um grau de liberdade de trabalho e atuação grande", frisou o palestrante.

Durante sua apresentação, Sampaio mostrou a legislação da Regularização Fundiária Urbana e mencionou alguns licenciamentos dentro do Programa Mananciais, principalmente de projetos. A exibição do Programa contou ainda com um resumo das intervenções com os valores investidos por fase e um detalhamento do sistema de distribuição de água potável e de ligação de rede de esgoto. "O importante é que com toda essa nossa experiência, tiramos um aprendizado grande do valor que tem a água para o ser humano, do bem que é a água, do direito que as pessoas têm a esse fundamental acesso a consumo de água. Sem ele, não teria vida", concluiu Ricardo Corrêa Sampaio.

Ao final, os palestrantes responderam às perguntas dos ouvintes que acompanhavam mediado pela mestre em Engenharia Civil Hidráulica e auditora de Controle Externo do TCMSP, Gisela Coelho Nascimento.

Você pode assistir o evento completo aqui:

 

Gisela Coelho Nascimento, mestre em Engenharia Civil Hidráulica, auditora de Controle Externo do TCMSP e mediadora do evento

Vicente Andreu Guillo, ex-diretor-presidente da Agência Nacional de Águas (ANA)

Amauri Pollachi, presidente em exercício do Comitê da Bacia Hidrográfica do Alto do Tietê

Ricardo Corrêa Sampaio, coordenador das atividades do Município de São Paulo no programa "Mananciais" e responsável técnico pela execução de obras e projetos

 


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