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Assessoria de Imprensa

O programa "Encontros Plurais", iniciativa da Escola Superior de Gestão e Contas do Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCMSP), encerrou sua temporada em 2020, na última sexta-feira (4/12), com chave-de-ouro: discutindo o destino da maior e mais importante cidade da América do Sul e os desafios da nova administração pós a definição das eleições municipais.

 

Foram convidados para o bate-papo a professora da EACH/USP e pesquisadora do CEM/USP, Ursula Peres, e o coordenador-geral do Programa Cidades Sustentáveis, integrante do Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para Agenda 2030, membro do Conselho do Global Compact da Organização das Nações Unidas (ONU), do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República (CDES), do Conselho do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social e do Instituto Akatu pelo Consumo Consciente e da Atletas pelo Brasil, Jorge Abrahão.

 
 
Mediaram a abordagem dos caminhos possíveis para a cidade nos próximos quatro anos os apresentadores Florestan Fernandes Jr., jornalista, e Maurício/Xixo Piragino, diretor presidente da Escola Superior de Gestão e Contas.
 
 
O primeiro assunto pautado foi a exclusão social, que, segundo Florestan Fernandes Jr., tem impactado muito a vida do paulistano, já que há um aumento da população de rua. Dito isso, Florestan perguntou a Ursula como o prefeito Bruno Covas, reeleito em segundo turno, pode enfrentar essa questão. "Realmente não é um desafio simples, a gente sabe que, em boa parte, a solução desse tipo de questão depende do desempenho macroeconômico do país, ou seja, depende de políticas que não estão especificamente a cargo do município, mas o município tem muito que fazer na sua ação em políticas públicas, seja pelo lado das políticas tributárias, da forma como ele arrecada recursos pensando na questão da desigualdade da cidade, seja pela forma como ele utiliza esses recursos. Então, tem uma série de políticas que o município já teve e que estão mais arrefecidas, como políticas de assistência social pensando em uma complementação de renda por parte do município, para além daquela que é feita pelo governo federal, que antigamente era o Bolsa Família e que nesse ano foi o auxílio emergencial; tem a possibilidade do município fazer uma complementação disso com acompanhamento das famílias a partir dos seus Centros de Referência da Assistência Social (CRAS), para acompanhar essa população de rua. Há outras ações como Operação Trabalho, que você pode ampliar em várias áreas vendo como trabalhar e inserir essas pessoas e, obviamente, tem uma parte da atuação, em um primeiro momento, que depende de ter um acolhimento adequado a essas pessoas. Hoje, as centrais de acolhida têm dificuldade de receber essas pessoas. [...] Também pensar operações a partir de microcrédito, que você financie e influencie a organização a empreender de pequenas cooperativas. De alguma forma a gente tem que contrabalancear esse ciclo negativo de atividade econômica até que a gente possa ter uma retomada mais forte. A cidade não pode ficar convivendo com essas pessoas na rua sem nenhum tipo de encaminhamento. Uma política tributária mais progressiva na cidade, além do que já foi pensado, por exemplo, no IPTU, pode ajudar a ter recursos necessários para dar conta dessas ações", pontuou Ursula.
 
 
"Eu diria que tenho concordância com os secretários que respondem que a desigualdade é o maior problema", ressaltou Jorge Abrahão. "A questão é quando nós chegamos na prática disso. A desigualdade é uma coisa que vem sendo construída no Brasil há muito tempo, eu falo no Brasil para chegar em São Paulo, evidentemente. O Brasil é um dos 10 países mais ricos do mundo, mas, por outro lado, ele é um dos 10 países mais desiguais do mundo. Então, é esse ponto que a gente tem que, de alguma maneira, enfrentar, pois soubemos construir, gerar riqueza como nação, mas somos incapazes de distribuir essa riqueza. Essa é uma questão fundamental e isso aterrissa nas cidades e na principal cidade do país, que é São Paulo. Nós temos que ter efetivamente um enfrentamento a isso e eu até penso que São Paulo, pelo papel que tem, poderia ser referência nessa questão do enfrentamento das desigualdades, porque o que é feito em São Paulo tem um olhar, ela influencia todas as cidades do Brasil, quem sabe até da América Latina. Esse é um problema que marca o Brasil e marca a região da América Latina também. Eu percebo que é um problema muito importante para enfrentarmos e que nós não vamos enfrentar de uma maneira trivial e usual. Temos que invertemos as prioridades da cidade, quer dizer, a política tem que ter a coragem de inverter as prioridades da cidade. [...] Eu colocaria que o desafio é investir nas regiões mais vulneráveis desproporcionalmente. Nós não devemos mais avançar priorizando recapeamento de asfalto da região central da cidade de São Paulo, isso não dá mais. Alguma camada da população vai ter que abrir mão de enfrentar alguns problemas para que a gente consiga resolver outros estruturantes. Eu só estou dando um exemplo, mas a inversão de prioridades, o orçamento maior nos espaços mais vulneráveis, eu acho que é um dos caminhos para enfrentarmos isso", completou Abrahão.
 
 
O coordenador-geral do Programa Cidades Sustentáveis defende, inclusive, a formação de pactos na sociedade para atender o eleitorado de classe média-alta e, ao mesmo tempo, destinar recursos para a periferia. "Esses pactos são, efetivamente, com escolhas. A crise que estamos vivendo, que antecede a pandemia, mas que a pandemia fez com que ela se aprofundasse, está demonstrando que todos nós, todos os setores, todos os segmentos, todas as classes sociais estão sendo impactados por ela. É evidente que algumas dessas classes, as classes mais favorecidas, conseguem avançar nisso de uma maneira menos sofrida que as classes mais carentes, mas elas estão sendo muito impactadas também. [...] Eu acho que as lideranças, de uma forma geral, as lideranças de países, de regiões, de estados não estão à altura dos desafios que estamos vivendo. As lideranças ainda estão pensando nos seus núcleos, na defesa de interesses de quem os apoiaram ou as apoiaram e nós estamos com problemas que ultrapassam hoje essas bolhas de apoio e até as fronteiras, muitas vezes, que a gente tem de cidades, de estados e de nações. Estamos precisando de lideranças que enxerguem isso como uma oportunidade. É uma tremenda oportunidade trazer 3/4 da cidade de São Paulo que não tem acesso a serviços de qualidade, que vive em condições de pobreza, de pobreza no sentido mais amplo do termo, que não tem condições de acessar nada que a cidade coloca, a não ser lutar por sua sobrevivência, é uma grande oportunidade conseguir trazer, incluir na sociedade um contingente maior de pessoas. Eu diria que a maneira é a gente ter coragem de enfrentar isso, ter a coragem de criar pactos até com as classes que apoiaram, e vêm apoiando por décadas, governos conservadores, mas que estão levando a crises importantíssimas e que não vamos superar, a crise da desigualdade é uma dela".
 
 
Na mesma linha do que foi expresso por Abrahão, Xixo questionou Ursula se é possível fazer essa inversão sem um plano de participação popular efetivo na cidade. A professora acredita também que é preciso fazer essa inversão. "Quando a gente olha o mapa de São Paulo, tem uma enorme concentração de equipamentos e de investimentos no centro expandido e para fora desse pedaço vão rareando os equipamentos e os investimentos. Quando a gente pensa em orçamento, o orçamento tem uma questão de perversidade que é: onde você já tem as instalações, os equipamentos feitos, há uma tendência inercial a você manter. Já tem escola, já tem rua, já tem hospitais e você precisa manter, então isso vai drenando orçamento. Se você de fato não fizer uma mudança brusca de prioridade, para isso, eu concordo, precisa ter vontade política, a inercia é manter, seguir o que já existe e seguir o que já existe é manter a exclusão de quem está fora. Para trazer quem está fora, precisa de inversão de prioridade. O que a gente viu historicamente nas nossas cidades foi que as inversões de prioridades vieram com discussões de arenas coletivas, arenas coletivas como na do orçamento participativo. [...] E aqueles recursos que têm vinculação, eles têm que ter uma revisão de prioridade. Para isso, a gente precisa combinar os dados, que a gente já tem por distrito de indicadores, com dados distritais de orçamento, que isso a gente não avançou. Essa é até uma discussão que o Tribunal de Contas do Município de São Paulo está agora buscando apoiar com o Observatório de Políticas Públicas para regionalizar o orçamento e a gente cruzar essa oferta que existe hoje com a demanda. Quando a gente fizer esse cruzamento vai ficar muito mais evidente ainda esse nível de exclusão. Para além disso, eu queria dizer que a gente tem que investir na discussão das receitas. A forma como a gente tributa nessa cidade reforça as injustiças, reforça a desigualdade. [...] Somos hoje ainda muito dependente de receitas de tributação indireta, seja o ICMS, que é uma conta a parte que a gente recebe do estado, seja o ISS de São Paulo, que é extremamente pujante, eles recaem fortemente sobre a população mais pobre. São tributos que não são cobrados em função de renda, são cobrados em função de consumo de serviços, então, independentemente da renda, todo mundo paga e isso traz um paradoxo para a nossa discussão de políticas públicas porque a gente busca ser progressivo na despesa, mas a partir de uma regressividade de receita. Sendo assim, claro que o vetor final não é o mais justo que poderia ser", analisou Ursula.
 
 
Sobre mobilidade, Ursula afirmou que não é imaginável que uma cidade como São Paulo possa sobreviver nos próximos anos a partir do transporte individual. "Nessa perspectiva que estamos falando de desigualdade, de problema de poluição, não tem como garantir esse espaço de hoje para o transporte individual e a gente pode financiar melhor o transporte coletivo com um ônibus mais confortável, mais agradável, financiar corredores a partir do custo maior ao transporte individual. [...] Muita gente não vai gostar de uma coisa como essa: aumentar rodízio ou colocar um pedágio urbano, mas é algo que não tem como fugir, tem que pensar nisso, o futuro tem que ser o investimento no transporte coletivo", reforçou.
 
 
Abrahão também falou sobre a descentralização na cidade, caracterizando como um tema central. "Quando começou a pandemia nós fizemos uma pesquisa em São Paulo, quero dizer, pegamos dados da cidade para mostrar esse problema da desigualdade e a gente percebeu que 60% dos leitos disponíveis na cidade estavam em três das 32 subprefeituras e em três subprefeituras do centro expandido da cidade, portanto, nós temos aqui um problema de concentração muito forte em relação a questões de saúde na cidade de São Paulo, mas se a gente fizer um trabalho em relação à educação, vamos perceber que a grande maioria da oferta, digamos assim, do ensino superior também está no centro expandido da cidade de São Paulo. E quando nós olhamos os empregos observamos que há distritos que oferecem, a Barra Funda é um exemplo, seis vezes mais empregos do que a quantidade de pessoas disponíveis nesse distrito. E em lugares como Cidade Tiradentes tem 0,2 empregos por habitantes na região. Existe uma centralização na oferta de empregos também. [...] E quando a gente liga isso à mobilidade, são os mais vulneráveis que levam 2h30 por dia para acessar todos esses serviços. Então nós percebemos que essa centralização é estruturante e ela coincide com as camadas mais ricas da sociedade e a desigualdade é mostrada aí. Equipamentos culturais da cidade de São Paulo também estão nesse centro expandido. Quando você olha a cidade, vê toda uma concentração das questões e a grande parcela da população que vive fora tendo que acessar gastando um longo tempo dentro do transporte coletivo, que anda, na verdade, em corredores que são os espaços mais poluídos da cidade, portanto, subordinadas aos efeitos das horas em transporte que vão levar a problemas graves de saúde. [...] Nós só vamos resolver isso, eu acredito nisso, com a participação da sociedade, criando espaços em que a legislação avance e institucionalize essas participações", refletiu o membro do membro do Conselho do Global Compact da Organização das Nações Unidas (ONU).
 
 
Ursula complementou: "De fato, uma descentralização real e forte precisa acontecer em todos os sentidos, uma descentralização administrativa, uma descentralização política em que esses espaços de discussão tenham a possibilidade de fato de incidir nas políticas públicas e isso não pode prescindir de uma descentralização orçamentária e essa descentralização orçamentária eu acho que tem duas facetas importantes para a gente diferenciar. A gente precisa mudar a concepção de como fazemos a política e contratar serviços para as políticas públicas. [...] A gente tem que conseguir descentralizar a informação orçamentária para distribuirmos esse orçamento na cidade. Isso vai nos permitir, inclusive, a discussão coletiva sobre como estão divididos os recursos e certamente vamos visualizar o que a gente já sabe, que é essa concentração de recursos na área central, de tudo, dos equipamentos e também dos grandes contratos, porque onde está o equipamento, preciso de mais recursos, de manutenção dos contratos e isso vai incidir".
 
 
Voltando o olhar para a Educação, Abrahão diz que 85% das pessoas dependem do ensino público e prevê um aumento da demanda devido à crise econômica que o Brasil está vivendo. "O aprimoramento desse segmento é muito importante. Agora, imaginar que vamos conseguir, repentinamente, distribuir tablets para as pessoas fazerem suas aulas remotamente sem que isso tenha sido construído dentro de um processo, acho que beira a ingenuidade. A questão não é só tecnológica, você tem a questão do equipamento, mas você tem a questão que essas pessoas pobres, que são a maioria das pessoas que estão nesses espaços, elas não têm acesso a uma banda larga que permite que elas consigam ter essa educação a distância. E elas não têm muitas vezes o ambiente favorável, eu digo o ambiente físico favorável, para poder também avançar em um processo de concentração que permita a elas terem esse aprendizado. Eu reuniria algumas questões que têm que ser desenvolvidas com o tempo. Não é repentinamente que nós vamos fazer. Têm outros pontos que precisam ser considerados. A escola no Brasil é um espaço de segurança alimentar e ela tem um papel fundamental nesse sentido para as famílias. Ela é um espaço em que, sobretudo a mulher, consegue nesse momento em que as crianças estão nesses espaços, desenvolverem suas atividades, portanto, tem um papel social muito importante. E a sociabilidade das crianças, a questão da assistência social, a questão de uma escuta, que a escola tem esse papel em relação à criança, é fundamental. [...] Nós tínhamos que ter criado durante esse período de pandemia, em que as escolas estiveram fechadas, as condições de higiene, de acesso, de melhoria de equipamentos, de repensar a estrutura para que as aulas possam ser retomadas. Eu acho emergencial uma retomada efetivamente, sobretudo do ensino público, pelo papel que ele desenvolve. Agora, nós temos que ter uma infraestrutura para que isso possa ocorrer com segurança. É possível, mas os governos já tinham que ter começado", defendeu o também membro do Conselho do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social.
 
 
Ursula contou que seu recado para o prefeito Bruno Covas, em sua nova gestão, é para que revise a forma como cobra os impostos na cidade. "Eu acho que o IPTU pode incidir nessa concentração imobiliária que a cidade tem. Dá para repensar, ao mesmo tempo, o cadastro e a forma de alíquotas mais progressivas. O ISS também tem que incidir de forma mais incisiva aonde está a concentração de recursos. Então, pelo lado tributário tem que pensar essa tributação e eu diria: reative o grande conselho de discussão participativa da cidade com toda a representação temática e territorial. A partir daí vamos rediscutir as políticas e descentralizar o que for preciso, mas começaria nisso".
 
 
Já Abrahão falaria ao prefeito eleito: "Olhe também para os 2 milhões de votos que o seu adversário Boulos teve porque não é pouca coisa 2 milhões de votos de uma pessoa como o Boulos, sendo o Bruno Covas o prefeito que estava no poder. Tem uma sinalização importante aí. A permanecer esse modo de governar, supostamente haverá mudanças no futuro e um prefeito, normalmente, quer fazer o melhor ou ele tem a intenção de avançar. Então, olhar com humildade para o que significa esses 2 milhões de votos que o adversário dele teve é muito importante. [...] E é importante investir nos lugares mais vulneráveis, pactuando com a sociedade de uma forma geral", finalizou.
 
 
Confira aqui a programação do lançamento do Observatório de Políticas Públicas do Tribunal de Contas do Município de São Paulo, citado por Ursula Peres.
 
 
Você pode assistir o programa Encontros Plurais completo aqui:
 

 

 

O programa "Encontros Plurais" encerrou sua temporada em 2020 com chave-de-ouro: discutindo o destino da maior e mais importante cidade da América do Sul

 

O jornalista é um dos apresentadores do programa

 

Maurício/Xixo Piragino é diretor presidente da Escola Superior de Gestão e Contas

 

O entrevistado é coordenador-geral do Programa Cidades Sustentáveis

 

Ursula Peres é professora da EACH/USP e pesquisadora do CEM/USP

 

 

 

 


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