Avaliação do Usuário

Estrela ativaEstrela ativaEstrela ativaEstrela ativaEstrela ativa
 

*Sílvio Luiz Giudice


Para o controle de enchentes existem métodos convencionais, ou seja, os canais, diques/polderes, galerias de águas pluviais e os não convencionais, como pavimentos porosos, detenção em coberturas de telhados planos e lotes e outras técnicas compensatórias em drenagem urbana, ainda incipientes no Brasil, além das bacias de amortecimento de cheias, por meio dos reservatórios de detenção.

1. INTRODUÇÃO

Os reservatórios de detenção, popularmente conhecidos como “piscinões”, são estruturas hidráulicas que têm como função retirar e acumular temporariamente um volume de água do sistema de drenagem, contribuindo para a redução dos impactos da urbanização sobre os processos hidrológicos de bacias urbanas, principalmente quando o sistema de drenagem já está prestes a saturar perante um evento chuvoso de maior magnitude. Tecnicamente essas estruturas são intituladas de reservatórios de detenção, mas com o tempo passaram a ser chamadas de “piscinões”.

Essa retirada de água temporária pelos reservatórios de detenção tem como principal função o amortecimento dos picos de cheias com consequente redução dos efeitos das inundações urbanas, além de eventual diminuição dos volumes de escoamento superficial (infiltração) e consequentemente da poluição difusa. O armazenamento de água se dá por um tempo relativamente curto e após os eventos chuvosos, os reservatórios são esvaziados por gravidade ou por sistemas de bombeamento.

Eventualmente, as áreas dos reservatórios podem ser utilizadas nos períodos secos para outras finalidades, como recreação e lazer, com quadras esportivas e/ou praças públicas e áreas verdes.

 piscinoes fig 1

2. URBANIZAÇÃO

Os efeitos do escoamento superficial podem ser atenuados por meio de infiltração, ou armazenamento na vegetação, no sub-solo, em pequenas depressões e nas áreas de várzea. Conforme a bacia hidrográfica se desenvolve e é impermeabilizada pelo aumento da urbanização, menor é o grau de infiltração no solo e como consequência, maior é o coeficiente de escoamento superficial, com aumento das vazões de pico. Com isso os volumes de água que escoam diretamente para os canais são cada vez mais expressivos e com o tempo as seções hidráulicas passam a ser insuficientes para veicular todo escoamento gerado no próprio canal.

piscinoes fig 2

Diante desse fato, durante a década de 90, o Departamento de Águas e Energia Elétrica – DAEE elaborou estudos que consideravam a implantação de reservatórios de detenção para amortecimento de picos de cheias em locais onde não havia mais possibilidade de ampliação da seção hidráulica e melhoria das condições de escoamento do canal, principalmente nas bacias dos rios Pirajuçara e do Tamanduateí.

Posteriormente, o Plano Diretor de Macrodrenagem da Bacia do Alto Tietê – PDMAT, elaborado pelo Governo do Estado de São Paulo, em 1998, indicou locais para a implantação de diversos “piscinões” com o objetivo de atenuar as inundações nas principais bacias hidrográficas da Grande São Paulo.

Esses reservatórios normalmente são implantados através da escavação do terreno, lateralmente, ou em ambas as margens de um curso d`água, funcionando apenas nos eventos chuvosos mais intensos e de maior abrangência, permanecendo vazios durante a maior parte do ano.

Com o acúmulo dos excedentes de vazões de cheias em seu interior, é possível um retardamento no escoamento das cheias, da ordem de algumas horas ou até mesmo dias, dependendo de suas dimensões e dos equipamentos de controle disponíveis.

Os efeitos favoráveis nos trechos imediatamente a jusante dos reservatórios faz-se sentir de forma direta, sendo cumulativos os benefícios quando se tem num mesmo curso d`água diversas retenções, propiciando inclusive a implantação a jusante, de seções hidráulicas com dimensões e custos menores, quando necessária adequação da calha complementando a ação dos efeitos hidráulicos do reservatório.

Indicações e Aplicações

Preferencialmente, os reservatórios de detenção são indicados para locais onde a ampliação dos canais e galerias é muito onerosa e a bacia altamente impermeabilizada, bem como nos locais  onde ocorrem inundações recorrentes com prejuízos materiais, sociais e as vezes até   humanos.

3. TIPOS DE RESERVATÓRIOS

Os reservatórios de detenção podem ser abertos ou fechados (cobertos ou subterrâneos, onde em zonas urbanas densamente ocupadas, não existem áreas para implantação a céu aberto).

piscinoes fig 3

Existem também os chamados reservatórios de retenção, que têm a função de regularizar a vazão de descarga num valor desejado, mas diferentemente dos reservatórios de detenção, retêm uma lâmina permanente de água, normalmente com uso integrado, podendo compor ao mesmo tempo um cenário paisagístico junto a parques e eventualmente com espaços para recreação e lazer.

No que se refere à implantação, os “piscinões” podem ser classificados como “in-line” ou “off-line” (item 4 a seguir), isto é, no próprio talvegue do corpo hídrico ou construídos nas margens, ou seja, lateralmente ao corpo hídrico.

piscinoes fig 4

No que diz respeito aos aspectos construtivos e componentes, os reservatórios podem ser implantados por meio do barramento de um córrego ou de um canal, simplesmente escavando o solo, onde normalmente,  devem possuir um vertedor, com intuito de garantir a segurança do barramento, sendo ainda, que em alguns casos, é necessária a implantação de uma estrutura de dissipação a jusante da descarga do vertedor, visando evitar fenômenos erosivos localizados. Invariavelmente, devem dispor de uma grade de retenção no canal de aproximação (descarga - emboque) visando preservar a seção hidráulica de obstruções por conta de detritos como galhos de árvores, sacos de lixo, dentre outros.

4. CLASSIFICAÇÃO DOS PISCINÕES QUANTO SUA IMPLANTAÇÃO

4.1. Em Linha (In-Line): escavado junto ao talvegue, ampliando a seção do canal num trecho, ou como “barragem seca”. Possui estruturas de controle das vazões defluentes, reservando certo volume durante um tempo determinado e retornado os volumes ao leito de jusante, abatendo o hidrograma afluente, sendo que normalmente funcionam por gravidade e não são operados.

4.2. Lateral (Off-Line): escavado fora do leito ou calha do rio, recebe as águas excedentes do canal e determinado valor de vazão de cheia, sendo que o retorno dos volumes pode se dar por gravidade ou por meio de bombeamento. Normalmente as descargas defluentes que retornam ao leito do canal são operadas, conforme programação pré-estabelecida ou por sistema de válvulas de pressão.

O reservatório lateral é o que apresenta maior eficiência, pois só retém e reserva volumes excedentes do hidrograma de cheia, estabelecidos por um limite de vazão máxima em função da capacidade de descarga da canalização. Os volumes podem não retornar ao canal durante determinado período de tempo.

Conforme projeto e dimensões, esses volumes podem não retornar ao canal de origem (podem ser destinados para outros usos ou podem ser transpostos para outra bacia, por exemplo). Nesses casos, em que volumes não retornam ao canal, ocorre o efeito de impacto zero, simulando-se a permeabilidade do solo, que retém os volumes de infiltração.

 

5. VANTAGENS E DESVANTAGENS DOS PISCINÕES

Além de garantir a redução dos problemas de inundações localizadas, o armazenamento do escoamento superficial tem os seguintes potenciais benefícios:

• Caráter multifuncional, agregando áreas verdes e de recreação e lazer em consonância com projetos urbanísticos;
• Facilidade de limpeza e menor custo em função de concentrar os sedimentos e lixo (retenção);
• Redução da poluição difusa de origem pluvial (concentração da poluição difusa);
• Dispensa da necessidade de sistemas de drenagem a jusante, quando é possível adequar a vazão afluente de acordo com a capacidade do canal, ou redução dos seus custos.
Da mesma forma, esse tipo de dispositivo hidráulico possui alguns inconvenientes e dificuldades associados à sua implementação e operação:
• Custo da aquisição da área com eventual desapropriação;
• No caso de estruturas com bombeamento, há risco de falhas na operação;
• Falta de manutenção constante e adequada pode propiciar a proliferação de vetores de doenças de veiculação hídrica;
• Utilização inadequada para lançamento irregular de resíduos sólidos
• Dificuldade na obtenção de áreas (inexistência)

Efeitos Hidrológicos

Em geral, os reservatórios de detenção redistribuem as vazões ao longo de um intervalo de tempo maior, diminuindo as vazões de pico, sem reduzir o volume do escoamento direto, mas formando um volume útil temporário, com parte do escoamento direto, que corresponde à área compreendida entre o hidrograma afluente e efluente da bacia de contribuição.
Os efeitos da urbanização de uma bacia e da implantação de um reservatório de detenção sobre um hidrograma de cheia podem ser observados na figura a seguir:

piscinoes fig 5

Os reservatórios de detenção são normalmente concebidos para controlar os efeitos das chuvas locais, de curta duração e alta intensidade, pois são estas as causadoras das inundações mais frequentes. O efeito da redução dos picos do hidrograma de uma cheia é sentido com maior eficiência logo  a jusante da estrutura do reservatório, com diminuição significativa das vazões no canal.

6. CONCLUSÕES

A implantação de reservatórios de detenção em locais onde não há alternativas para melhoria das condições de escoamento do canal por meio de ampliação (alargamento e/ou rebaixamento), é sem dúvida uma solução eficiente para atenuar os efeitos maléficos das inundações.

Entretanto, há de se ter cuidado com a visão de que a solução venha a se tornar uma prática revolucionária em relação aos conceitos tradicionais em drenagem urbana, como se fosse uma solução mais eficiente.

Na área de drenagem de águas pluviais tem-se atualmente o conceito da importância de manter as vazões naturais, o mais próximo possível durante o desenvolvimento dos projetos, ou pelo menos compensar eventuais incrementos nas vazões de pico por meio de armazenamento e infiltração através de técnicas como o caso da chamada Lei das Piscininhas, implantada em alguns municípios da Região da Grande São Paulo, que sem dúvida, diminuem de alguma forma os impactos da urbanização.

Nesse sentido, recentemente foi divulgado um artigo na internet  da empresa AQUAFLUXUS Consultoria Ambiental em Recursos Hídricos, intitulado “Os perigos da quebra de paradigmas” (http://www.aquafluxus.com.br/) sobre um programa de drenagem sustentável do Ministério das Cidades que considera a detenção e a infiltração das águas pluviais e desconsidera soluções por meio de canalização. A respeito uma Prefeitura Municipal da RMSP apresentou um projeto de canalização para obtenção de recursos junto ao Programa de Aceleração do Crescimento – PAC e teve o mesmo recusado pelos motivos  exemplificados naquele artigo, conforme reproduzido a seguir:

“....canalização para acelerar os escoamentos de um trecho do rio ? e alguém diz:
“Que ideia ultrapassada é essa ? Acelerar escoamento não pode.…”


O que é importante ressaltar, conforme também descrito no referido artigo, é que em alguns casos, a aceleração do escoamento pode ser uma alternativa mais eficiente do que implantar reservatórios para abater as vazões de pico, evidentemente, desde que o corpo receptor tenha condições para assimilar esse incremento de vazão. O rol de alternativas que envolvem um projeto de drenagem tem sempre que ser analisado com muita acuidade, pois cada caso tem suas peculiaridades e as interações hidrológicas de toda bacia devem ser previamente analisadas.

Comparando os dois sistemas de retenção citados, para o mesmo efeito de abatimento de um hidrograma de cheia, o “lateral” necessita de um volume disponível menor.

Em sistemas de macrodrenagem compostos por várias retenções integradas a canalizações, os volumes de retenção do tipo “lateral”, operados, são os mais recomendados e eficazes com relação aos resultados esperados. Nesses casos, dependendo da operação do sistema, o efeito conjunto das retenções poderá equivaler à soma de todos os volumes.

Para volumes de retenção do tipo “em linha”, o efeito de um conjunto desses dispositivos não é equivalente à soma de seus volumes alocados num único reservatório de retenção. Nos projetos de retenção “em linha”, se possível, deve-se utilizar um único volume logo a montante da seção do canal onde ocorrem os extravasamentos. Esse posicionamento permite controlar toda bacia de contribuição considerada.


*Sílvio Luiz Giudice
Engenheiro Operacional (FEOSP) e Tecnólogo em Construção Civil – Modalidade Obras Hidráulicas – Faculdade de Tecnologia de São Paulo (FATEC / SP). Exerceu os cargos de Diretor da Bacia do Alto Tietê e Baixada Santista – BAT, foi Assessor Técnico da Superintendência do Departamento de Águas e Energia Elétrica, atualmente é Gerente de Engenharia da Diretoria de Engenharia e Obras - DEO. Foi Professor da disciplina Sistemas de Operação e Manutenção de Drenagem na área de Engenharia Sanitária do Departamento de Hidráulica e Saneamento Ambiental (HSA) e das disciplinas Hidrologia Básica e Drenagem Urbana do Departamento de Transportes e Obras de Terra (TOT) da Faculdade de Tecnologia de São Paulo - FATEC-SP.

 


Adicionar comentário

Código de segurança

Atualizar

 
 
 
 
 
 

 

Assine a nossa newsletter para receber dicas de eventos, cursos e notícias da Escola de Gestão e Contas.

 

INSCREVA-SE!